7 de novembro de 2009

Escritos II

Eu te detestava a cada dia mais. Não por qualquer coisa que você fizesse, mas só pelo fato de você existir. E a cada dia você me dava mais provas do quanto me amava, do quanto faria qualquer coisa pela minha felicidade. Mas isso não era suficiente pra tirar o ódio do meu coração. Você era tudo o que eu mais detestava, e ao mesmo tempo tudo o que eu mais precisava. Eu não suportava ouvir sua risada, mas não conseguiria ver sentido na vida sem o seu sorriso. Teu cheiro me repugnava, ao mesmo tempo que me embriagava como o néctar dos deuses. Mas uma coisa em você eu nunca detestei: seu gosto. Adocicado o suficiente para torna-se viciante e amargo em alguns momentos, só pra me lembrar que aquilo era proíbido. Eu não deveria sentir seu gosto. Isso eu detestava. Eu queria aquele gosto para mim, queria tê-lo por toda a eternidade. Não que eu pudesse me imaginar feliz ao lado de alguém que eu tanto repugnava, mas também não poderia ser infeliz ao lado do homem da minha vida. Nunca entendi o que eu sentia por você, meu pequeno grande amor, ou melhor dizendo, meu maior terror.

Eu era só um menino com sonhos de menino, e você, o meu tio preterido.
Você me tocava, me amava, me fazia ser seu.
Eu te tocava, eu te xingava, eu te queria, eu te repudiava...
.. eu te amava.
Sempre tive medo de ficar a sós com você, mas era o momento do dia que eu mais esperava. Você fazia coisas incríveis. Eu sempre me sentia tão bem, tão mal, tão sujo, tão amado, tão amante, tão almadiçoado, tão completamente apaixonado. Sempre que eu percebia ser o fim de mais uma avalanche do seu desejo, eu te odiava. Com todas as minhas forças. Te agredia verbal e fisicamente, te mostrava todo o rancor e toda a dor que eu sentia quando o ato se consumava. E te deixava ali, deitado naquele tapete, chorando e se amaldiçoando por ser quem era, e por me fazer aquele mal. Mas no momento em que eu fechava a porta do seu quarto, meu único refúgio naquela casa infestada de pecado e dor, eu me arrependia de não ter aproveitado mais daquele momento. Me arrependia por deixar naquele estado o homem que eu amava. Não que eu soubesse que te amava, eu tinha apenas 10 anos, não sabia o que significava aquele turbilhão de sentimentos dentro de mim, afinal você era o meu tio, o tio de quem eu menos gostava, o tio que me fazia sentir dor, a dor mais prazerosa que pode existir.
Mas uma coisa eu sabia, eu te detestava. Te detestava por me fazer gostar dos momentos que passavamos juntos. Momentos que, mesmo eu sendo uma criança, sabia serem proíbidos, impuros e pecaminosos. Se você não existisse mais, seria tão mais fácil. Mas meu egoísmo não me deixava pensar nisso. Eu precisava da sua respiração. Do seu hálito quente na minha nuca. De suas mãos que me faziam sentir sensações indescritíveis. Eu não podia gostar de tudo aquilo, era tão sujo. Mas eu gostava, e te culpava por me fazer gostar. Por me fazer te amar, quando isso era tão imundo.
Hoje, depois de tantos anos, eu ainda me arrepio ao pensar em você. Me arrepio de amor, de desejo, de nojo, de medo. Você sempre foi meu vilão, mas ninguém, além de você, salvou minha vida tantas vezes. Agora sei que eu te amava. De um modo que eu nunca mais amei ninguém. Nem mesmo a esposa que eu escolhi me satisfaz como você, meu tio. Eu te detestava porque sabia que você nunca seria inteiramente meu. Sempre haveria sua mulher. Sempre haveria seu medo que as pessoas da família descobrissem o seus sentimentos por mim.
Agora, só o que me resta são as lembranças e a amarga sensação de perda. Te perdi,e hoje eu sei o quanto eu te amava. Como dói...
 Adeus, meu amor.