4 de fevereiro de 2013

com a boca amargando.


        
Ar. Finalmente. Tragou o ar gelado da noite longa e profundamente, afastando com isso a nuvem negra do torpor que insistia em persegui-la, mas não por muito tempo.
Lá estava a causa-raiz de todo aquele burburinho interno. Parado, tragando tranquilamente seu cigarro.

Definitivamente não era para ela estar daquele jeito. Algo estava errado.
A tontura correspondia com a quantidade de álcool ingerida, mas e todas as outras sensações estavam totalmente equivocadas e desconexas.
Havia dor, havia a sensação de perda e ao longe ela podia ver o nuvem negra do torpor se aproximando.
Não, não podia ser. Não agora... não depois de tanto tempo. Não depois de já ter visto aquela cena tantas e tantas vezes, com tantas e tantas pessoas diferentes. Não.. ela não era esse tipo de pessoa.. Então porque será que seus olhos insistiam em lacrimejar? Porque sua boca estava seca e a cena não parava de se repetir na sua cabeça?
Ele estava falando, ela ouvia pequenos fragmentos. Pequenas porções de ácido, que perfuravam sua pele, camada por camada, chegando ao osso, chegando á alma.
Sua boca estava amarga.
Ela não sabia onde colocar as mãos. Cabelo, boa, rosto. Apoio, ela precisava se apoiar em algo, as porções ácidas das palavras dele a estavam destruindo, mutilando.
Apoiou seus braços em uma superfície e enterrou os cabelos em suas mãos. Ele ainda estava falando. Ela não queria mais... O gosto amargo se intensificou em sua boca e não havia mais o que mutilar. Saiu andando, deu as costas e se trancou em si mesma novamente, bloqueando o torpor, sentindo cada fragmento da dor. Ela merecia, ela precisava.


Quando a solidão da multidão passou, nada havia acontecido. Seu corpo se movia, seu sorriso continuava ali, como que petrificado em seus lábios. Gargalhava, fazia piadas e dançava, dançava, dançava..
O copo não saiu mais de suas mãos, assim como o gosto amargo em sua garganta. Amargo como a certeza de que aquilo havia doído e de que permaneceria doendo por muito tempo.
Mas, por agora, ela simplesmente dançava.

Ver como que um sonho, dormir como que uma vida. O gosto amargo sempre estará lá, entranhado no fundo da minha garganta, mas isso não impede que o gosto doce chegue aos meus lábios.. Nunca impediu antes.